quinta-feira, 6 de novembro de 2014

PEC 37, MPV 657 e PEC 107: quais benefícios para a sociedade?

De pronto respondo: nenhum. E acrescento: vai atrapalhar.

O objetivo dessas proposições e mais tantas que adormecem e volta e meia tramitam em nosso Parlamento possuem somente um objetivo: transformar o cargo de Delegado de Polícia em símile de Juiz. Na verdade uma imitação de Juiz, com prerrogativas de Ministério Público (incluindo salário), poder de força ao comandar a polícia e poder político, já que os demais não podem se candidatar a cargos eletivos, enquanto os delegados não possuem tal dispositivo em nenhuma das propostas por eles fomentadas.

E qual o perigo? O mesmo que D. Pedro II detectou em sem tempo: o Estado não pode concentrar poderes. E falamos de um Imperador!!

O cargo de Delegado era uma espécie de juiz - visto que os policiais de fato eram, muitas vezes, analfabetos - e somente era ocupado por magistrados ou bacharéis em direito. Falamos de 1871.

Esse sistema imitava o português, onde o juiz investigava e julgava, chamado inquisitivo. Acho que não preciso dizer que isso não funciona, basta lembrarmos da Santa Inquisição.

Com a mudança do sistema criminal na Europa, D. Pedro proíbe magistrados de assumirem tal função, justamente porque quem acusa não julga. Então o cargo passa a não ter exigência de Direito para ocupá-lo.

Enquanto isso os demais países usam 2 juízes no processo: um para investigar e outro para julgar. Juiz de garantias.

Então o Ministério Publico se fortalece pelo mundo, sendo clara a necessidade deste ator no processo criminal. E quase 100 anos depois a maioria dos países adota o seguinte modelo (e os que não adotam estudam seriamente tal hipótese):


1- Notícia de um crime. A policia informa ao MP que irá investigar ou o MP determina que a policia investigue

2- Os atos da investigação são relativamente simples, seguindo um rito geral já informado pelo MP. Quando há complexidade o MP atua EM CONJUNTO com a polícia. Afinal, o trabalho é feito para o MP, não para a imprensa.

3-Terminada a investigação (sem cartório e burocracias mil), o MP decide se denuncia ou não à Justiça.


Desta forma a necessidade do profissional do Direito se restringe ao seu lugar natural: O PROCESSO JUDICIAL.

Mas no Brasil o importante é olhar para trás: com saudades do que não viveram, os delegados - que em sua grande maioria não atuam como policiais, mas imitam juízes, por isso a existência de intimações, cartórios, escrivanias e escrivães - querem se consolidar novamente, 150 anos depois, como se magistrados fossem.

Por isso a concentração de poderes, com a exclusão do MP nas investigações, como queriam com a PEC 37.

Por isso modelo de prova idêntico ao do MP e Justiça para seu concurso público, sendo que nem 5% do exigido será usado na função de presidir inquérito.

Por isso a criação bizarra do Delegado conciliador, de forma a aumentar essas funções e transformar o ambiente policial em uma monstruosa justiça de "pequenas causas" para tratar sabe-se lá de que (não pode ser especial, visto que esta é do judiciário)

Por isso a tentativa de emenda constitucional (PEC 107) para tratar a função como imprescindível à Justiça (é um cargo do executivo)

Por isso a aberrante ideia de policia autônoma, enquanto nas grandes democracias as policias possuem controles múltiplos, sendo o MP o órgão autônomo, pois não possui braço armado. Estado policialesco.

Tudo isso trará pdoeres maiores que o Poder Judiciário, com os mesmos salários, justamente porque terá O PODER DAS ARMAS E DA INVESTIGAÇÃO.

Extremamente preocupante.


Obs: o ato que cria o inqúerito é o Decreto 4.824, de 22 de novembro de 1871

terça-feira, 13 de maio de 2014

O que a PEC 51 tem de "esquerda" se propõe o que se faz nos EUA?


Hoje, navegando por algumas postagens em redes sociais, percebi que há um certo movimento "de direita" contra a PEC 51, como se fosse um mero "projeto de esquerda" sem que essa sequer se mobilize pró. 

Infelizmente um assunto de Nação tem sido reduzido a um debate político, onde o que vale é a sigla do parlamentar proponente, não o tema em pauta. E isso justifica muitas "opiniões" de quem sequer leu o texto da proposta. Sendo assim, comentarei alguns pontos que tenho visto questionamentos:


1- controle central da policia: não há uma virgula no texto falando sobre isso. Alias, é o contrario: cada ESTADO monta sua estrutura de policia e permite que MUNICÍPIOS tenham as suas. Isso é controle central? É algo que se resolve com a simples leitura da proposta. Aliás, hoje, por serem forças auxiliares das Forças Armadas, um presidente que resolve convocá-las precisa apenas dar a ordem ao Comandante do Exercito. HOJE sim a polícia é CENTRALIZADA, mas deixará de ser com a PEC 51.

2- Fim da policia por deixar de ser militar: A maioria dos países europeus que ainda as adotam não usa policias militares em regiões urbanas. Geralmente policiam zonas rurais e fronteiras, e tem ligação com o "legado" da Segunda Guerra, sendo na verdade um ranço das invasões de tal período. Não é por se tornar civil que não tem uniforme, hierarquia e disciplina. A Inglaterra nem podem ouvir falar em policia de caráter militar, tanto que NENHUMA faz parte da Interpol, só as de caráter civil (pressão dela e dos EUA).

3 Nossos bandidos são violentos: A SWAT americana é civil, tem treinamento e poder de combate militar. Mas é civil. O COT da PF é Civil, o NOE da PRF é Civil, a CORE, Tigre e tantas outros grupos nas Policias Civis são... civis! Porque um Choque não pode ter caráter civil? Não é a missão que determina a natureza da instituição e sim o contrário.

4- enfraquecimento das FAs: o exército precisa de salários melhores e mais equipamentos ou um contingente que um dia pode ser "chamado de seu"? Os EUA tem as FAs mais bem preparadas e equipadas do mundo e não tem gambiarra de policia vinculada a elas. Uma coisa não influencia na outra.

5- Ouvidorias: hoje, se você for vítima de abuso de um policial, tem 2 opções: corregedoria ou Ministério Público. Na prática só é punido se a vítima for MUITO INFLUENTE ou se o acusado for desafeto de alguém forte dentro da corporação. E olhe lá! Em relação ao MP, em geral ele somente faz um despacho para a apuração por parte da Corregedoria e acompanha de longe. Em suma: reclamar praticamente não adianta! Fora o medo.

6- A Ouvidoria viria justamente para permitir que se crie um espaço, ocupado por nós, da sociedade, de forma a permitir a apuração de desvios, pois sem vínculo com uma polícia, encorajará o cidadão a reclamar seus direitos violados. A contrapartida? Em caso de denunciação caluniosa, o policia deve acionar judicialmente quem o acusou e ser devidamente indenizado. É bom para o policial e para o cidadão.


7- Mudança previdenciária: O STF já falou: não aposentou? Então pode mudar. Não precisa dessa PEC para mudar - pois nem trata do assunto Previdência, basta qualquer outra que trate ESPECIFICAMENTE disso. Portanto não ira mudar porque a PEC 51 foi aprovada.


Desmilitarizar não significa destruir a história, os heróis, as fardas, as medalhas e honrarias: trata-se somente de regular a instituição por dispositivos legais CIVIS, deixando os Códigos Penal Militar e Processual Penal Militar somente para as Forças Armadas, onde tem seu motivo de ser. Ainda teremos policia fardada na rua, como era a Guarda Civil Metropolitana de SP antes de 1964.

Para reforçar que não há um "caráter de esquerda" nesta proposta, uma breve comparação com a estrutura dos EUA, um pais belicista e que não possui os melhores índices de criminalidade e igualdade social (mas que nem se comparam com os nossos, claro!):


1- policias federais, estaduais e municipais: os EUA tem milhares de policias, todas nessa estrutura.

2- ciclo completo: das milhares de policias nos EUA, TODAS são de ciclo completo

3-Desmilitarização: NENHUMA das policias americanas é militar ou tem vínculo com as FA´s. 

Portanto, senhores, a proposta nada tem de "esquerda", visto que o pais mais liberal do mundo usa um sistema bem parecido com o proposto.

Ah, e lembrando: ela não UNIFICA, ela PERMITE UNIFICAR as polícias, o que é bem diferente.



sábado, 29 de março de 2014

O luto no aniversário da Polícia Federal

De um Policial Federal:

Ontem, 28 de março, a Polícia Federal completou 70 de história. Como todo órgão ligado à defesa ou segurança, nem sempre com passagens lembradas com orgulho, lembranças de belos serviços prestados. Mas tudo ligado ao momento histórico vivido por nossa sociedade, um fotografia de cada época.

Eis que nestas 7 décadas, provavelmente nunca o órgão esteve tão cabisbaixo, tão sem ânimo, tão apático. E isso ficou claro em cerimônia realizada na Academia Nacional de Polícia, em Brasilia, durante o Curso de Formação de policiais, peritos e delegados.

Durante a cerimônia, o corpo de instrutores das atividade reconhecidamente específicas de polícia - Armamento e Tiro, Técnicas operacionais e Educação Física, responsável pelas técnicas de defesa pessoal - funções essas que sempre mostraram o orgulho de ser policial, policial federal, e de ser professor, silenciaram durante a execução do Hino do DPF, que apesar de não possuir os versos mais belos, sempre encheu de orgulho aqueles que amam a atividade e, principalmente, aqueles que aguardam ansiosamente por sua nomeação no DPF, o início de sua nova vida.

Cabeças baixas, ombros arqueados para frente, mostraram o peso de se exercer uma atividade, ou melhor, duas, que são essenciais a qualquer povo mas pouco ou nenhum respeito recebem. E neste caso específico nem dentro da própria instituição, que vem a largos passos se encaminhando para o fim, por conta de uma política de segregação e do combate à toda e qualquer tentativa de profissionalização de gestão, modernização e produtividade. Não há orgulho onde não há respeito.

Talvez esses professores-policiais não tenham noção da amplitude de seus atos. Talvez não lembrem dos riscos que já correram em seu dia-a-dia - como perder o emprego, ser ferido, ser morto - das horas longe da família, das dores passadas para se tornarem policiais e posteriormente professores destas atividades. Provavelmente nem percebam a importância de sua função naquele momento - a de PROFESSOR - e que por isso são alvo do duplo descaso e desvalorização dessas atividades: um professor de polícia. Somente um louco! Parece uma dupla maldição apenas. 

Mas ali não estava apenas a tristeza de um grupo, estava a derrocada da sociedade brasileira. Sem professores - elemento importante na construção de uma sociedade - não há policiais que deem conta de organizar a coletividade. Aliás, nem policiais se terá, somente capangas. Sem ambos, não há um pais. De toda sorte, este silencioso manifesto mostra a penúria em que se encontra a educação e a segurança pública no Brasil, e mais especificamente - certamente o motivo primeiro deste protesto - o esquecimento e abandono da Polícia Federal e de seus Policias (agentes, escrivães e papiloscopistas). Por tudo isso ali estava a vergonha, o pesar. 

Em função desse ato, certamente responderão disciplinarmente, pois policiais mostrarem descontentamento no Brasil chega a ser considerado crime - como é o caso das polícias militares - mas tenho certeza que a dor de cabeça que terão não apagará a força da imagem, além de não ter o poder de aquebrantar a alma e a honra desses bravos guerreiros, policiais e professores. E muito menos diminuir a sensação de representatividade, pois tenho certeza que muitos gostariam de estar ali, fazendo exatamente o que fizeram

Não bastasse tudo por que passa a polícia no Brasil, para "comemorar" esse aniversário do DPF, mais um policial dá fim à própria vida, no interior de São Paulo. Um não, dois, pois um Policial Civil do Distrito Federal se jogou de sua janela na mesma data. Foi esse o presente sinistro recebido pelos Policiais Federais.

O vídeo:
https://www.youtube.com/watch?v=Gw0vouy_HBc&feature=youtube_gdata_player

segunda-feira, 24 de março de 2014

Força Nacional de Segurança Pública ou "cobre a cabeça e descobre o pé"


Pois bem. Antes era a Polícia Federal que vivia nos noticiários em horário nobre, mas esta foi substituída pela FNSP, muito provavelmente pelas brigas internas entre delegados, peritos e policiais e seu sucateamento, promovido pelo Governo Federal. Mas porque será que a Força Nacional está em tão alta conta, com equipamentos estalando de novos, enquanto a PRF e a PF ficam sem estrutura?

Bem, a resposta pode ser a pior possível: criação de uma guarda que não se submete à lei, mas à vontade do governante. E ainda se presta a ser uma ferramenta de intervenção branca nos Estados.
Enquanto as policias civis, militares, federais, rodoviários federais e guardas municipais tem previsão na nossa lei maior, a Constituição Federal, a Força Nacional teve sua origem em um decreto presidencial.  E tem um motivo.

A FN não é um órgão de segurança, ela deveria ser um convênio entre a União e os Estados para que, em momentos de crise, se pudesse retirar policiais, bombeiros, membros da Defesa Civil, e apoiar o Estado que precisa. Mas no caos que vivemos, qual  Estado NÃO precisa? E qual pode abrir mão de seus policiais para apoiar outro?

Além do mais, enquanto está em missão fora de seu Estado, o policial, além de receber seu salário normalmente, pago em sua sede, ainda recebe uma diária que, por mês, representa algo em torno de R$6.000. Líquidos, sem impostos. Ora, porque então não se aprovou a PEC 300, que previa custeio federal para bem remunerar as Polícias Estaduais?

A questão é essa: o Governo Federal  optou por criar uma guarda que pode controlar (pois quem vai abrir mão de 3x o salário por mês para reclamar de problemas estruturais?), sem previsão constitucional, e ainda retirando ao seu bel prazer policiais que deixam de fazer a segurança da população para atender interesses políticos, fortalecendo ações de governadores aliados e enfraquecendo ou submetendo os oposicionistas. E mais: em plena era de pedido por desmilitarização e ciclo completo, cria-se uma espécie de Polícia Militar Federal com policiais estaduais.

Sem dúvida a Segurança Pública está no fundo do poço em nosso pais. Órgãos permanentes sendo sucateados para que “mercenários” (não é criticando o policial que vai, que fique claro, é mera alusão à Idade Média) sejam usados para fazer as vontades políticas do líder maior.


Lamentável.

terça-feira, 11 de março de 2014

Precisamos entender: polícia é muito mais que tiro, porrada e bomba!

Nos países mais civilizados, as polícias, seja militar ou civil, são, em geral, preparadas para lidar com o caráter civil de sua atividade. Tanto é que boa parte delas é são justamente de tal regime , tendo os países anglo-saxões uma certa repulsa por policia de caráter militar, o que obriga os demais países que possuem tais organizações em seus sistemas a não tratarem de assuntos internacionais através dessa entidades. Em suma: Interpol não tem policia militar, mesmo que seja a com melhor qualidade de investigação. Ao menos na Europa.

Bem, mas nem quero falar do caráter militar, pois, a bem dizer, a policia no Brasil é bem violenta e inficiente de forma bem democrática, pouco importando o regime. Por isso precisamos de uma forte reforma, como a PEC 51. Porém uma reforma não apenas legislativa, mas de pensamento.

Sendo assim, hoje resolvi publicar um documentário, com apenas 16 minutos, que trata dos estragos causados nas incursões policiais em comunidade carentes, em geral dominadas pelo tráfico. Fica claro que tratamos de uma guerra civil, pois há uma parcela da sociedade que não pode contar com a policia: não porque seu serviço seja mal prestado, mas porque foi feita para mantê-los afastados de outros grupos sociais. Para elas polícia é o inimigo. E para a policia eles são o inimigo. No final morre policia, morre bandido, morre cidadão. E nada se resolve.

Nesse contexto que questiono nossas políticas: as policias da Europa Ocidental possuem vários programas de recrutamento em minorias, que significa admitir indivíduos pertencentes a grupos que historicamente sofrem abusos, preconceitos ou segregação. Muitas até reservam vagas para mulheres, pois sabemos que o ambiente sempre lhes foi hostil, mostrando a força descomunal das pertencentes aos quadros das forças de segurança pelo mundo. O Japão também adota essa política, visto ser uma sociedade fortemente machista.

A ideia por trás disso é tornar a polícia mais democrática, que atenda aos anseios da sociedade e de determinados grupos sociais, tentando conciliar a manutenção da ordem, os direitos fundamentais e a inclusão de determinados grupos. Mas parece que no Brasil se pensa justamente o contrário. Bem, nada surpreendente dado o sistema retrógrado de Segurança Pública que possuímos, claramente datado no tempo da chegada da Coroa no Brasil.

No mais, gosto sempre de frisar: faculdade de direito não prepara policial. Os atuais cursos de formação – talvez excluindo-se os de Formação de Oficiais – também não. Por isso os mesmos países citados acima consideram a sociologia matéria obrigatória na formação de tais profissionais, com o mesmo peso das leis, técnicas operacionais e de Administração, principalmente quando os profissionais se preparam para os cargos de gestão (em geral policiais da base possuem uma carreira, o conceito de carreira única)

Obs.: na operação de que trata o documentário, foram mortos 13 civis e um policial excepcionalmente treinado e equipado. Não deveria ser condição normal nem os 13 mortos e nem um policial deste naipe morrerem em tempos de paz. Mas no Brasil parece que é.


domingo, 9 de março de 2014

A lógica do “bandido bom é bandido morto” ou: estamos em guerra?

     Não, não é um texto “comunista” dizendo que temos que tratar bem quem nos mata. Nem um texto “reaça” que defende que se “passe fogo” em todo mundo mesmo não havendo pena de morte no Brasil. É apenas uma reflexão se estamos no caminho certo.

     A situação que vivemos hoje nos leva de volta no tempo, onde o senso de justiça é a vingança, única alternativa diante da impunidade. Então voltemos bastante, até a chamada “Lei de Talião”. Digamos, aí, aproximadamente 1730 ANTES DE CRISTO, na Babilônia. É, aliás, citada no Antigo Testamento.

     Bem, à época era comum a lei do mais forte, onde após uma ação que gerasse dano a uma parte, a outra poderia “se vingar”. Só que quem era mais forte fazia uma vingança maior, normalmente desproporcional ao dano. E quem era mais fraco simplesmente não se vingava.

     Eis que então surge a ideia de que ao sofrer um dano, a pena de quem o fez será IGUAL ao sofrido. Portanto, caso lhe arrancasse um olho, poderias arrancar 1 olho do outro. Ponto. Nem mais nem menos.

     No decorrer da História surge a figura do Estado. Não existe apenas para recolher impostos e acolher corruptos: dentre várias de suas funções, surge a da Justiça e da proteção de sua sociedade. Desta forma o particular não pode mais penalizar quem o ofendeu: tal função cabe agora ao Estado, que decide através do Juiz se a pessoa realmente é responsável pela agressão e qual deve ser a pena a se aplicar. E somente o Estado tem o poder “de vingança”, para assegurar que a pena não passará dos limites estabelecidos.

     Com a evolução da humanidade, cria-se leis mais abrangentes, tentando regular os direitos e deveres das pessoas, tenta-se destituir de vez a possibilidade de uma pessoa fazer justiça com as próprias mãos e cria-se um pequeno núcleo com poder de usar a força contra os cidadãos, mas somente o necessário para se aplicar a lei: a polícia.

     Sendo assim as funções da polícia são: evitar que o crime aconteça, após acontecido, investigar (mas, como já vimos, não é exclusividade dela) e quando o Juiz, em nome do Estado, decidir por aplicar a pena, cabe a ela providenciar que o condenado seja apresentado à Justiça. Fim;

     Pois bem. Em pleno século XXI, uns 3744 anos depois da Lei de Talião, o Brasil se vê obrigado a ressuscitá-la. E por que? Simplesmente porque a impunidade é certa. Enquanto governantes ficam mostrando números absolutos, a realidade é dura: 50.000 pessoas morrem assassinadas por ano e somente 2.500 o Estado consegue mostrar quem foi. Punir esses 2.500 é outra conversa. Se me falarem que 1.000 são condenados E cumprem suas penas, ficarei espantado. Em numeros relativos: 5% se descobre o autor e talvez 2% se consiga uma condenação. Se chegar a isso tudo. Relembro sempre que em muitos países 50% é considerado um sistema fracassado.

     E é nesse cenário que aparece a cobrança da sociedade em se fazer a justiça como era ANTES da Lei de Talião: furtou sua carteira? MORTE. E o pior: não é uma ideia absurda, É NATURAL. Sim, pois onde não se tem justiça se tem vingança.

     O cidadão pensar dessa forma é natural. Não há quem se imagine na condição de vitima ou familiar de vitima e não queira vingança. Mas por isso o Estado deve ser forte: conseguir punir o criminoso, de forma a dar um pequeno alento à vítima, e demovê-la de se vingar, dada a certeza da punição se o fizer. O que preocupa é quando a Polícia resolve encampar essa ideia. Não pode.

     Para o policial também é difícil não se envolver. Como tratar alguém como simples estatística? É como o médico que vê apenas “o paciente”, não vê a pessoa, sua historia, seus familiares, enquanto clinica. E um policial sem sentido de humanidade se torna um perigo absurdo para ele e toda coletividade.

     Agora vamos à lógica do problema: independente dos fatores que levam o sujeito a se tornar criminoso, quanto vale a vida dele para o cidadão de bem? Acredito que nada. Mas todo mundo, em condições normais, dá mais valor à sua vida que a dos outros. Então, para um bandido que a vida vale nada, quanto vale a de um cidadão de bem? Percebe a lógica? Chegamos em um simples resultado: a vida não vale nada. E se ele sabe que morrerá pois não dão valor a ele, não se preocupará em dar valor aos outros.

     Segurança pública é tema muito, mas muito mais amplo que polícia e cadeia: começa com educação formal e social, sentido de coletividade, de amparo aos que entram na chamada zona de risco (o ECA, em suas punições mais graves, tem esse objetivo, mas peca por não supor que menores podem cometer crimes tão ou mais bárbaros que maiores de idade e de forma reiterada), economia funcionando, equilíbrio de renda. Até se chegar na prevenção de crimes há muitas etapas para fracassarem e até a execução da pena temos muitas outras. No nosso caso, TODAS fracassam.

     Então o que fazer? Bem, não defendo que se passe mão na cabeça de bandido, mas tenho minhas dúvidas se matar todo mundo adianta algo. Não criaria uma divisão entre grupos que acabam se rivalizando? Não é isso que vem acontecendo? E pior: não estaria a policia, até mesmo sem perceber, atuando como grupo armado de um dos lados?

     Dos 50.000 homicídios neste pais, tenho certeza que boa parte vem da “limpeza do bem”. Contraditório, penso. Basta ver: vivemos uma grave crise de segurança, mata-se “bandidos” como nunca e mesmo assim a coisa só piora? E nosso vizinhos? E os EUA? E a Europa?

     Nenhum pais em tempos de paz tem tantas mortes como nós. Nenhum pais é tão ineficiente em todas as etapas da segurança pública como nós. E nenhum deles tem tanto “bandido morto” como nós. Estariam eles errados? Não devemos repensar tudo?

     Defendo que o cidadão tenha de forma mais tranquila a posse de uma arma. Creio sim que a legítima defesa está aí para ser usada, mas dentro dos ditames legais. Não nego que prisão perpétua, com colônias impondo trabalho seriam soluções interessantes. Também creio que em meio ao caos que vivemos a polícia tenha uma “pegada mais bélica” em determinadas situações e regiões. Mas não podemos achar que isso é corriqueiro ou que assim vai resolver algo. Só piora. E muito menos achar que a polícia tem como função matar bandido. Não é algo de oficio, é decorrência do trabalho. Pode parecer besteira, mas faz muita diferença. A morte deve ser a exceção e não regra. E tudo isso não passa de mero paliativo, uma tentativa de se sentir seguro pelo instituto da vingança. Engodo.

     O primeiro passo para a mudança seria estancar esse desarmamento covarde da sociedade que vem acontecendo. Acho sinceramente que cairiam os mortos com isso. Não falo de porte, que é o sujeito carregar a arma consigo, é tê-la em casa ou no trabalho. Obviamente as armas deveriam ter um registro como as pessoas, de forma que se possa identificar se ela for usada. A lei até determina isso, mas nunca foi aplicado.

     Depois a eficiência das polícias. Em 70 anos nossas polícias só aprenderam duas coisas: conseguir confissões e matar. Mais nada. São péssimas em investigar. E a estrutura atual, de duas meias policias, garante a ineficiência, que gera a impunidade, que gera o sentimento de vingança, que gera a pressão na policia por matar. Por isso a defesa fervorosa da PEC 51 e de mudanças no procedimento de investigação policial. Se outros países conseguem porque nós não?

     Em seguida a eficácia da pena, pois ao se ter a sensação que ao menos a maioria dos que cometem um delito são punidos, se tem a redução de incidência, pois ninguém quer ser preso (e nem adianta falar em auxilio prisão). Mas essa etapa, além de tudo, precisa da primeira, uma polícia eficiente.

     Por fim, de forma paralela a isso tudo, o suporte a crianças e jovens, de maneira a IMPEDIR que vejam no crime – principalmente os violentos – um futuro promissor, mesmo que curto. O crime nunca acabará, é inerente ao convívio em sociedade, mas temos como reduzi-lo. Essa é a luta.

     Se praticamente todas as religiões pregam que não se deve matar, que não se deve dar continuidade ao ódio, porque acabamos por não apenas aceitar essa realidade como a incentivamos? Não é nosso desejo viver em uma sociedade menos violenta? Como queremos tal resultado fomentando a violência?

     Lembrem-se “olho por olho dente por dente” foi uma evolução para restringir as penas, não a permissão para a vingança. E como dizia O Profeta Gentileza, figura lendária no Rio de Janeiro:

“Gentileza gera Gentileza Amorrr”.





sexta-feira, 7 de março de 2014

PEC 51, a pec da paz, pec 37 e 102, as pecs da impunidade. Maravilha. Mas... o que é PEC?

 Bem, desde meados de 2013 este espaço tenta colocar reflexões sobre a Segurança Pública, e acabou se vendo com a obrigação de discutir algumas PECs. Muito se falou nelas, mas todos sabem o que é.

 PEC é a abreviação de Projeto de Emenda Constitucional. Seu objetivo, como o nome diz, é emendar, ou alterar o texto, da nossa Constituição, nossa lei maior. Todas as demais leis se submentem ao que está escrito nela. É a lei mais difícil de ser alterada, e por isso é necessário apoio da sociedade para ver tais alterações prosperarem.

 E porque uma alteração dessas teria capacidade de me fazer sentir mais seguro?

 Bom, obviamente a troca de uma frase por outra não consegue. A questão é o poder que essa alteração pode ter. No caso de nosso tema, a alteração permitiria se ter uma polícia mais eficiente (o tal ciclo completo, impede o crime e investiga quando ele ocorre), com pessoal mais estimulado (pois passa a ter um conceito de carreira dentro da policia, não algo isolado), com mais uma forma de controle de suas atividades (a ouvidoria, além das já existentes corregedorias internas e o controle externo pelo Ministério Público). Na situação que nos encontramos, isso já faz uma grande diferença.

 Porém a alteração não pode parar aí, e nem podemos resumir segurança pública a um ou dois parágrafos de texto: temos que compreender como algo bem complexo, que passa pela educação, pelo suporte do Estado a certos setores, pelo cuidado e zelo com o patrimônio público, pela obediência a regras de segurança, leis de trânsito e tantas outras coisas. Mas nada disso tem chance sem polícias capazes de trabalhar, de produzir. Essa mudança é emergencial e altera o estado atual das coisas.

 Portanto a PEC 51 se traduz em uma mudança em nossa lei principal. Uma mudança que permitirá o modelo atual, engessado, ineficiente, onde todos os Estados são obrigados a seguir um modelo que não funciona para nenhum, ser alterado para outro, onde a população de cada Estado possa discutir, de acordo com suas necessidades, que tipo de policia precisa e quer. E permite também uam mudança de mentalidade, que não consta no texto a futura lei, mas será necessária por conta das alterações feitas. Um ganho indireto, porém valiosíssimo, já que é isso que nosso povo espera.

quarta-feira, 5 de março de 2014

Estão ressuscitando a PEC 37?

Está circulando pelas redes sociais e imprensa um documento atribuído a uma associação de delegados defendendo prerrogativas de magistrados para tal cargo: "independência funcional" (entenda-se: fazer o que bem quiser) e não mais se submeter ao controle externo (olha o porque são contra a PEC 51, que defende uma Ouvidoria além do MP). Mas... para que?

Bom, sinceramente não vejo utilidade alguma. Aliás, vejo com séria preocupação: como uma função estatal pode ter o uso da força, a restrição de direitos e não ter controle nem punição? Ou um ou outro, pois tudo junto é poder demais.

Nas democracias consolidadas as polícias recebem severo controle: quem tem a força tem que ser monitorado. Tanto é assim que os modelos atuais de polícia sempre envolvem severa proximidade do MP, principalmente nas investigações. No mundo ocidental, nos países democráticos ao menos, NÃO HÁ uma policia repleta de poderes. Muitas, aliás, tem duplo controle do Executivo - sendo vinculadas aos nossos equivalentes Ministério da Justiça e Ministério da Defesa - e seus atos de restrição de direitos e de investigação submetidos ao MP e à Justiça. E mesmo assim não são poucos os desvios. Obvio que nem se comparam aos ocorridos no Brasil.

A polícia tem duas finalidades: GARANTIR os direitos individuais e coletivos, basicamente mantendo a ordem social e OBTER INFORMAÇÕES caso crimes tenham ocorrido. E essas informações serão utilizadas pelo Estado - normalmente através do Ministério Público - para que a Justiça decida se deve apenar alguém ou não, pois sua função é impedir a vingança.

Como membros de um poder, Juízes e Promotores sofrem pressões, e por isso é garantido a eles somente serem removidos se concordarem com isso. Novamente, esse é o padrão das justiças em outros países. A pressão é inimaginável, já que a decisão do juiz é quem de fato decidirá o futuro de um indivíduo ou grupo.

Já a policia, apesar de suas características diferenciadas, não sofre tamanha pressão POLÍTICA, salvo de forma interna: é a investigação que deve seguir uma linha porque o delegado quer, é o delegado que é pressionado pelo chefe de polícia (delegado) para fazer determinado relatório... pressões não tão diferentes das que sofrem um professor que adota certa linha de ensino.

Mas e as "remoções de geladeira"? Novamente, o caráter é meramente político e interno. Toda remoção deve ser justificada. Se o servidor não concorda, pode questionar administrativamente, e se recusado, judicialmente. Em suma: não é o Governador ou Presidente que remove o servidor, é o administrador - normalmente um delegado - quem determina.

Além do mais, o juiz de direito é o 3o escalão do Poder judiciário (Ministros dos tribunais, desembargadores, juízes), já os delegados são, no mínimo, 4o (Governador, Secretario, chefe de policia, delegado), tal qual os policiais ou qualquer servidor público. No contexto da Justiça, a polícia é mero acessório, tanto que não é o único órgão que investiga. Ele não representa um poder, ele é um servidor público do Executivo. O juiz também é servidor público, mas ele é a base do Poder Judiciário, seu motivo de ser. Não há similitude alguma. Em nada. E ainda é subordinado à Justiça quando esta precisa utilizar a força - sofrendo uma espécie de filtro do Executivo. Mas parece que alguns querem mais poder que a Justiça.

Portanto para que as mesmas prerrogativas? Para piorar o que já não funciona? Se são so delegados que ocupam funções comissionadas de administração e presidem o inquérito policial - o instrumento de formalização da investigação policial no Brasil - de quem é a culpa pels 95% de homicídios não elucidados, dos 97% de roubos sem solução, ou dos 92% de latrocínios de "autoria desconhecida"? E se com certo controle já está assim, imagine sem controle nenhum?

Ah, sim: esse era o teor da PEC 37.

sábado, 1 de março de 2014

Se aprovada a PEC 51 a policia não usará mais farda?

Uma das coisas que frequentemente ouço ou leio é a preocupação da atual PM virar "uma bagunça", sem um uniforme padrão e sem a tão propagada "hierarquia e disciplina".

Talvez tamanho equívoco se equipare apenas a achar que o conceito de ciclo completo de polícia - patrulhar e investigar na mesma instituição - signifique juntar as policiais civis e militares.

A PEC 51 conseguiu puxar o fio que mostra nosso pensamento sobre policias. E mostra o quão atrasado ele é, e a parte difícil da conscientização é quebrar o paradigma do atual modelo de duas policias, uma rígida e outra informal.

Uniforme não é exclusividade de instituições militares. Talvez a rígida exigência em relação a um visual padrão, sim. Hierarquia também não existe somente no meio militar. E disciplina é a capacidade de se manter uma cadeia de comando, não o poder de punição.
Tomemos de exemplo a atual PRF: cargo único, possui hierarquia, usa uniforme em todas as suas atividades, a disciplina é mantida basicamente pela Lei 8.112/90, a mesma do Serviço Publico Federal como um todo. Não tem nada de MILITAR, mas podemos dizer que vem se tornando MILITARIZADA. Afinal seus policiais são de natureza civil, respondem as mesmas leis que nós.

Então o que é desmilitarizar? Na verdade representa o fim do Regime Militar na corporação, que acarreta o seguinte:

1- os policias, quando fora de serviço, passam a ter o mesmo direito de qualquer cidadão (como falar mal do Governo ou do Chefe, por exemplo)

2- Passam a ter direito a associações representativas ou mesmo sindicatos. O direito à greve não tem ligação com ser militar, mas sim a proibição de se associarem para qualquer fim e o crime de "motim". Direito de Greve no Serviço Público é tema de debates no Congresso, e existe sempre a possibilidade de ser proibido que certas carreira façam, como policiais, mesmo civis.

3- Passam a responder por crimes previstos no código penal, tal qual qualquer pessoa. Hoje respondem pelo Código Penal Militar, que prevê crimes outros (na verdade, crimes de guerra), tem penas distintas dos mesmos previstos para o civil e ainda diferencia crimes cometidos por Oficiais e por Praças.

4- Deixa de ter ingerência direta das Forças Armadas, sem necessariamente deixar de ser visto como contingente auxiliar.

5- a Hierarquia cega e absoluta é substituída pela hierarquia funcional (somente seu chefe é seu chefe, e somente em função do trabalho) e legal (nada de ordens do tipo "eu quero").


Parece pouco, mas só de se conceder tais direitos aos policias já trará uma compreensão melhor de sua posição na sociedade. Sem a visão estrita que alguém tem que obedecer, o policial entenderá que o cidadão - no caso "o civil" - não é subordinado seu, não tem que obedecer cegamente por ser "ordem de uma autoridade". Ficará claro que deve prevalecer da função quando necessário para o cumprimento da lei e ordem social, e mesmo assim de forma crítica e sempre justificada. Nunca pela sua simples vontade.

O Brasil já teve uma polícia nesses moldes, a Guarda Civil de SP, extinta no Governo Militar. Era carreira única, fardada, hierarquizada e o principal: bem vista pela população.

Portanto, acabemos com o medo de desmilitarizar: os uniformes, patentes, medalhas, estrelas... tudo pode continuar como está. Deve-se trocar somente a lei que rege os servidores dessas polícias por uma que pode ser também bastante rígida, e trocar certos valores que não estão em consonância com a democracia, como a "visão do inimigo" e da obediência cega, por outros, mais democráticos, sem que se perca a noção de ordem e força normalmente associadas a tal regime.




quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

Você sabe como a policia investiga no Brasil?


    Ao contrário do que se pensa, por sempre vermos na TV agentes do FBI em suas emocionantes investigações, a investigação policial no mundo todo envolve muito papel, basicamente comunicações e relatórios, pois tudo precisa estar devidamente registrado. Até aí, nada demais, apesar de não ser uma vida tão cheia de adrenalina quanto parece. Porém, como tudo em nosso país, se envolve ineficiência ou burocracia, é coisa nossa! E o Inquérito Policial é o simbolo maior disso: ineficiente justamente por ser excessivamente burocrático.

    Seu atual formato foi desenhado em 1937 pelo renomado jurista Francisco Campos, em plena ditadura Vargas, dando origem ao nosso atual Código de Processo Penal, de 1941. Convenhamos, são “só” 73 anos de lá pra cá.

    Nesse meio tempo tivemos uma grande guerra, ditaduras por vários países, guerra fria, surgimento da União Europeia, criação fortalecimento da ONU, OTAN, crise do petróleo, restabelecimento da democracia, computadores e redes de dados, anticoncepcional, o celular e o micro-ondas.

    Muitos de nossos vizinhos reformularam suas policias e seus códigos de processo penal há pelo menos 2 décadas, e alguns já estudam novas mudanças. A Europa – através da Europol – tenta remodelar o sistema dos países membros, de forma a alcançar um modelo mais eficiente. Por lá, HOMICÍDIOS são resolvidos pela polícia em, pelo menos 55% dos casos, chegando a Inglaterra a 85%. Apesar de realidades muito distintas da nossa, não chegamos perto com os nossos 5% de resolução de crimes de morte. Não estamos perto nem de nossos vizinhos, muitos com economia pior que a nossa. Somos o pais da impunidade não apenas no discurso.

     Tomemos como exemplo o texto em que falava da PEC 37, usando como exemplo um suposto furto do celular da Deuzoli, sendo suspeito o Facebookson (artigo: Explicação não técnica sobre a PEC 37. Eu disse NÃO TÉCNICA!).

    Relembrando a historia, eles já haviam “ficado” e o suspeito, durante um pagode, tentou novamente “estreitar seus laços” com Deuzoli, mas diante da clara indiferença, foi embora. Ela então deu falta de seu celular, que jurava estar na bolas, e suspeitou de Facebookson.

     Para não ficar enfadonho, vou simular os atos com frases curtas, mas muitas dessa etapas são algumas páginas de papel. Relembro que dificilmente muito dessas etapas ocorreriam por conta de um celular sumido no caso concreto, mas elas ocorrem em outros crimes. E todos os atos certificados são encardenados em uma espécie de processo, o tal inquerito.


1- Deusoli informa à viatura de Polícia Militar que estava em frente ao evento. Os policias dão um giro pelo quarteirão e não veem Facebookson. É feito um Registro pelo acionamento da viatura. Deusoli é conduzida até a unidade da Policia Civil mais próxima.

2- chegando lá é registrado um B.O. (boletim de ocorrência), onde ela relata o que aconteceu e fala que suspeita de Facebookson. O documento gerado pela Pm é anexado.

3- Provavelmente no dia seguinte (já que isso foi durante a madrugada), a Autoridade Policial avaliará as chances de se chegar a algum resultado esta ocorrência. Se achar que sim, abre um inquérito policial. Se achar que não, “arquiva”. (detalhe: a lei obriga a ocorrência registrada se tornar inquérito caso nela conste conduta que possivelmente caracterize crime, no caso, a suspeita de furto. Além disso diz que só quem tem poder de arquivar é o Ministério Público, não a polícia).

4- o delegado entende que deve investigar. Instaura o inquérito, com data de “31 de novembro “ Começa a fase da papelada pesada.

5- ao escrivão para certificar a abertura (confirmar que o delegado de fato abriu o inquérito)

6- pedido de intimação de Facebookson para prestar esclarecimentos na delegacia.

7- Ao escrivão para certificar que o Delegado intimou Facebookson

8- aos investigadores para intimarem Facebookson. Pega-se uma viatura, com, no mínimo, 2 policias, procura-se a casa do sujeito, toca a capainha e pede a ele para assinar um papel dizendo que comparece dia 30 de fevereiro na delegacia para prestar esclarecimentos

9- ao escrivão para certificar o relatório dizendo que Facebookson foi encontrado e o documento por ele assinado.

10- Ao delegado confirmando que Facebookson foi intimado

11- No dia 30/02, Facebookson aparece na delegacia, abrindo mão de horas de trabalho, para ser indagado sobre o ocorrido. Questionado pelo delegado ele diz que não pegou nada e que uma amiga em comum permaneceu o tempo todo na mesa com ele, e dela se despediu, e ela pode confirmar que em momento algum ele tocou na bolsa de Deuzoli. Seu nome é Jaciara, mas não tem o contato dela.

12- O delegado então dita para o escrivão (que está ao lado dele) o texto que deve constar no depoimento: “Aos costume disse nada. (…) Que ao ser perguntado sobre se havia pego o telefone de Deuzoli afirmou que não, podendo Jaciara confirmar tal fato.

13- Ao escrivão para certificar o depoimento e intimar Jaciara

14- Aos investigadores para localizar Jaciara. Buscam em sistemas, ligam para Deuzoli, de forma a dar um jeito de achar Jaciara

15- como Jaciara foi encontrada facilmente, foi intimada para no dia 31 de abril.

16- como o prazo para encerrar o inquérito acabará, o delegado determina ao Escrivão que envie para o Ministério Publico solicitando mais prazo.

17- Ao escrivão para certificar o pedido de maior prazo e envio para o MP.

18- no dia 30 de abril o inquérito retornar com um carimbo do MP na capa: prorrogado por 30 dias.

19- dia 31/04 Jaciara, diarista, sendo obrigada a faltar o dia de serviço, se apresenta para ser ouvida.

20- questionada, informa que não lembra de ter visto Facebookson mexer na bolsa, mas não pode afirmar. Diz também que não o conhece tão bem assim. Mas Zuleide estava na mesa também, e pode ser que tenha visto.

21- o Delegado dita para o escrivão o texto a ser elaborado com as respostas de Jaciara: “aos costumes disse nada...”

22- Ao escrivão para certificar o depoimento e intimar Zuleide.

23- Zuleide se mudou para outro estado, sendo impossível localizá-la após 6 meses de tentativa e mais 5 pedidos de prorrogação de prazo ao MP. Cada tentativa implica em novo pedido do delegado, nova certificação do escrivão, nova informação do investigador, que gera nova certificação do escrivão, além do pedido ao MP.

24- após 1 ano do ocorrido, no dia 31/11, o inquérito é “relatado”, ou seja: o delegado faz um novo documento dizendo que, de acordo com o que consta no inquérito, não é possível determinar se houve crime, pois não se sabe se alguém pegou o celular de Deuzoli ou ela perdeu e nem determinar quem teria cometido, já que, além da duvida sobre existência de crime, nada demonstra que Facebookson poderia ter cometido ou mesmo alguma outra pessoa.

25- Ao escrivão para certificar o relatório e enviar ao MP.


     Olha que tentei não prolongar, ficou o maior texto até agora no blog, mas a coisa é MUITO PIOR . Há problemas de diligência pedidas pelo ministério público que pouco acrescentam, diligências pedidas por advogados de citados na investigação que acabam embolando o meio de campo... e com isso o que dava pra se fazer em 15 dias com maior chances de resolução e sem que ninguém perdesse dia de trabalho indo a uma delegacia, leva 1 ano para não dar resultado algum. Afinal, quem, depois de 90 dias, se lembra do que aconteceu de madrugada num “pagode”?

     Não adianta entrar em uma seara mais técnica, a intenção foi apenas mostrar o porque você é vitima de um crime e mesmo que se disponha a ir a uma delegacia, dificilmente verá o responsável punido. E apesar de dizerem que a Justiça solta, que as leis são fracas (outro artigo: Impunidade, policias, leis fracas e pec 51), o grande problema é que a polícia NÃO CONSEGUE DIZER QUEM DEVE SER PRESO: ou o sujeito é preso em flagrante (famoso “com a boca na botija”) ou não acontecerá nada com ele, salvo se um dos envolvidos for figura importante ou a vitima conhecida de algum policial.

   Por isso a reforma TOTAL do nosso sistema, tanto na estrutura das polícias como no modelo de investigação, é mais que necessária. 70 anos é muita coisa. Nosso vizinhos reformaram não tem nem 20...









domingo, 23 de fevereiro de 2014

Concurso público: seleção para o Serviço Público ou título de nobreza?


                Um dos aspectos mais polêmicos da PEC 51 é a estruturação da polícia como carreira policial única. E o que seria isso?

                Carreira no serviço público seria a progressão, em decorrência do tempo ou desempenho, para funções mais complexas e de maior responsabilidade durante a vida profissional. E a carreira é formada por cargos, que são o conjunto de responsabilidades de determinada função.

                Para facilitar, exemplifico a carreira de Oficial das Forças Armadas: o cidadão faz um concurso público para Oficial. Aprovado, é nomeado no cargo de Aspirante, que tem como função ser aluno do curso de formação. Formado, ele é nomeado para o cargo de 2º tenente, que tem como função, a grosso modo, comandar pequenos grupos e participar de algumas instruções. Em seguida é nomeado 1º tenente, que passa a ter grupos maiores para controlar e instruções mais complexas. Depois, nomeado capitão que tem mais funções administrativas e gerenciais, e assim segue.

                Então, quando se fala em uma CARREIRA POLICIAL, significa que o sujeito faz o concurso para a CARREIRA, ocupando a base da estrutura. De acordo com seu desempenho, tempo e aproveitamento de cursos de médio e longo prazo de capacitação, devem subir ao novo cargo, com mais tarefas a cumprir e maior responsabilidade. Atividades não afeitas a policiais, como as funções de cuidar do funcionamento, burocracia, pessoal e outras atividades da instituição, devem ter uma carreira administrativa também bem estruturada. 

                A vantagem deste sistema é que obriga o servidor a se capacitar ao longo de sua carreira, permitindo que se envolva em atividade onde melhor será aproveitado. Bem diferente de como (não) funcionam as polícias hoje.

                Atualmente o cidadão, ao fazer um concurso, decide para que casta fará (ou poderá fazer) o concurso: a nobreza (delegados e oficiais) ou vassalagem (policiais). A partir daí, enquanto um é obrigado a trabalhar como louco, com escalas absurdas e complementar renda com “bicos”, outro tem bons salários e, sem muito esforço, se vêem envolvidos em assuntos da alta política. Uns tem perspectiva de crescimento sem serem policiais, outros são policiais sem perspectiva de crescimento.

                E então surge a mágica: feito o concurso público, não há COBRANÇA para a qualificação – ou ao menos a manutenção – da qualidade do servidor. Na policia não há, por exemplo, nenhum tipo de avaliação técnica e psicológica para aferir se o policial tem condições de portar e utilizar, quando requerida, a arma de fogo que muitas vezes porta. Um policial pode passar 30 anos sendo considerado capacitado em armas apenas por conta do curso de formação na admissão. Coisas de Brasil.

                Nos EUA, a cada 6 meses os instrutores de tiros são avaliados. Os policias não instrutores, anualmente. Na Alemanha, a cada etapa na carreira o policial precisa fazer um novo curso e somente progride se tiver aproveitamento, indo de técnico ao doutorado, dentro da própria instituição em curso específico de policia. No Brasil, basta o concurso e no máximo 180 dias de curso de formação (alguns duram 45 dias!) durante a vida do profissional. Ele só se qualifica por iniciativa própria, sem diferença para sua carreira.

                O concurso público é a forma mais democrática para se ENTRAR no serviço público. É ferramenta eficiente para verificar quem, naquele momento, tem o melhor preparo para assumir a função. Digo entrar porque trabalhar e se preparar para concursos com maiores salários tornam-se incompatíveis no caso do policial: ou ele transforma o salário do cargo público em bolsa de estudos, praticamente parando de produzir, ou não passará. E como policias são até estimulados a fazerem “bico”em suas (poucas) folgas, ou trabalham e não estudam ou estudam e não trabalham.

                É perceptível que servidores públicos, principalmente em cargos de maior influência, são tratados e se portam como se adquirissem um título de nobreza, que não precisam de capacitação contínua. E pior:  que a Administração Publica não precisa evoluir, reconhecer que determinada organização precisa de reformulação e maior capacitação dos servidores, tanto na entrada (em geral exigência de maiores níveis de escolaridade) quanto durante sua vida profissional. O concurso não passa de uma fotografia da vida profissional do servidor, quando deveria ser a abertura de um filme que pode durar 35 anos. Mas parece uma ameaça às castas, interessadas em status.

                Em suma: carreira única proposta na PEC 51 prevê alterações nas atividades e atribuições de TODAS as carreiras policiais e de seus cargos, inclusive com a extinção de alguns deles e aglutinação de outros. Não é fim do concurso público nem “trem da alegria” (quando um cargo se torna outro, incompatível, sem concurso público, geralmente para aumento da remuneração): é CRIAR uma VERDADEIRA CARREIRA POLICIAL.

 Desta forma o policial se sentirá MOTIVADO a dedicar-se à sua carreira, pois sabe que existe uma perspectiva de avanço, e para progredir será obrigado a, NO MINIMO, se capacitar. E se bem remunerado poderá largar a atividade “bico” e cuidar da nossa segurança de fato, não apenas nos jornais e índices governamentais.

Particularmente acho que o modelo atual não funciona e tem que mudar. Radicalmente.

Obs.: justiça seja feita. Ao escrever omiti que o Curso de Formação do Oficial de Polícia Militar, em geral, é um curso superior em Segurança Publica, com duração média de 4 anos. Os prazos se referem aos demais cargos existentes nas estruturas das polícias.

               


                

sábado, 15 de fevereiro de 2014

É verdade que a policia só lida com lixo?


                A história da polícia no Brasil é um tanto torta: com missão primeira de garantir a defesa nacional, posteriormente ganhou a função de manter a ordem, que basicamente passava por tirar de perto dos brancos os negros libertos, os mestiços – pessoas socialmente desqualificadas que poderiam macular a “sociedade” da época – e tratar de questões materiais, principalmente a recuperação de negros escravos que fugiam.

                Dada a ultima função, era muito comum que se contratassem para o ofício os capitães do mato e os mesmos mestiços que não se queria ver “perambulando” pela rua. Devemos lembrar que escravos eram vistos não apenas como bem material, mas como escória social, assim como os capitães do mato, que deles descendiam em geral. Então não era bom para uma família “de bem” ter um dos seus envolvidos em tal atividade. No máximo se admitia a função de oficial, que nesta época não colocava o pé na rua praticamente.

                E porque essa conversa toda? Bem, sem entrarmos na questão atual de racismo, castas sociais ou qualquer outra de tal monta, foquemos no seguinte: garantir a ordem publica NUNCA foi atividade honrada neste pais. E certamente porque lá no início tinha que lidar com tudo que as classes mais altas queriam esconder. Além disso, como já disse, exerciam tal função aqueles que se sobressaíam da “gentalha”, mas que não deixavam de sê-la.

                E isso perdura até hoje. Constituições, sistemas políticos, alterações sociais... nada teve a capacidade de alterar a imagem do policial, principalmente o de policia preventiva. Não é trabalho para os “bem-nascidos”, ainda se pensa. E ainda se pensa que os policiais são da mesma “laia” daqueles que ameaçam a sociedade. Tudo bem,  existe sempre um controle social na função de policia, mas nem por isso, hoje, se deve misturar as coisas.

                Atualmente em países socialmente mais desenvolvidos, a atividade policial é reconhecida, é nobre. Não é a mais nobre das profissões, mas fica longe de ser uma vergonha para a comunidade, ao contrario daqui. E porque? Nesses lugares se reconheceu que  A POLICIA TEM COMO FUNÇÃO PRESERVAR NOSSA VIDA, NOSSA LIBERDADE, NOSSA INTEGRIDADE E NOSSA PROPRIEDADE. Quer função mais valiosa que essa, nos proteger?

                Mas não, ainda se prefere tratar como molambos, como capangas maltrapilhos que existem apenas para nos servir quando precisamos. E maltrapilhos não precisam ser bem pagos, bem preparados. Basta um prato de comida e algumas doses de cachaça.

                Porém os tempos são outros.  Vivemos uma guerra no Brasil e está claro que o modelo de policia não funciona, na verdade só nos põe em risco. E é um ofício de baixo prestígio e baixos salários, atrairá bons  profissionais, idealistas, mas vai certamente atrair pessoas despreparadas e mal intencionadas em maior numero, ou ao menos será mais fácil o acesso delas. Será que vale o risco? Dar uma arma a alguém com essa postura é prudente?

                Em 2012, cada brasileiro residente no país gastou aproximadamente R$220,00 NO ANO TODO com segurança pública. Sim, impostos. Mas lhe pergunto: está valendo o investimento ou você pagaria mais para se sentir mais seguro?  Nâo seria melhor reconhecer que as Policias não lidam com o “lixo humano”, mas, mesmo que em um controle social, tem como função garantir nossas vidas, o maior valor? Quanto custaria isso para você?


                É hora de enfrentarmos isso, reconhecermos a falência desse modelo coronel-capanga. Temos que cobrar uma policia preparada, com alta qualificação, bem remunerada, estimulada e, principalmente reconhecida. E, no atual estado das coisas, não adianta esperarmos isso com essa estrutura carcomida há séculos, temos que inovar. Por isso, além da mudança de mentalidade, a sugestão das alterações da PEC 51 se fazem necessárias, e, creio, levarão a tal mudança de visão em relação às polícias.

sábado, 11 de janeiro de 2014

A Polícia para Policiais - a falácia do "trem da alegria" na PEC 51

     Tenho visto reclamações sobre a PEC 51, que promoveria um "trem da alegria" nas polícias, que muitos seriam "promovidos" a outros cargos sem concurso, e mais um tanto de informações maldosas para desqualificar a emenda que, dentre outras mudanças, propõe o cargo único. 

    Apesar de prever a desmilitarização - e ser esta alteração seu carro chefe - nada impede que, mesmo em tal regime, se tenha a carreira única.

   A ideia de se dividir as tarefas nas Forças Armadas é para que, em caso de atividade militar típica (guerra), se mantenha o maior número possível de profissionais especializados e bem graduados na corporação. Esses são os oficiais, que levam anos para serem formados e custam muito caro para serem repostos.

   Por essa lógica, os combatentes de fato (soldados) tem uma formação mais básica, rápida mesmo, pois são as peças sujeitas ao desgaste do combate (ferimento ou morte). E como precisam de reposição rápida, tem-se o caráter de serviço militar obrigatório e temporário.

   A diferença entre eles é o vínculo: enquanto o oficial de carreira tem laços duradouros com a instituição, o soldado não o tem. Por isso basta se ter mão de obra com baixa qualificação, visto que a atividade será mais focada na parte física e será comandada rigidamente por alguém formado para tal. Essa é a lógica do Exército, por exemplo. Obviamente a descrição se dá de maneira muito simplória, desconsiderando oficiais temporários e a carreira de praça.

  Porém a Polícia é diferente. Todos os policiais tem vínculo duradouro com a instituição após tomarem posse. E todo policial deve ter boa formação e lhe ser exigida boa conduta, não sendo mero executor de ordens ou simplesmente a parte física da instituição. Não é porque frequentemente se envolve em confrontos que não precisa pensar. Isso vale para a guerra. Na segurança pública, cada disparo terá uma consequência, então mesmo em um combate, o policial tem que conhecer bem sua atividade para minimizar danos a sua equipe e a terceiros. Sua substituição custa muito caro à sociedade, visto a morte de um policial ser um dano social irreparável, além de todos os custos de formação de novo servidor.

  Portanto, para uma estrutura similar à militar, basta que se tenha admissão na base já com nível de escolaridade e dificuldade do concurso em bom nível, e para determinadas promoções - como de soldado a sargento e depois para tenente, por exemplo - se exija nova formação interna compatível com suas novas atribuições e que haja vagas em aberto para que possam ser ocupadas de acordo com critérios objetivos, como a colocação nesse curso de aperfeiçoamento. Afinal, as atividades de oficiais e praças nas PM´s são decorrentes uma da outra e se complementam. Isso já ocorre dentro das Carreira de Oficial das Forças Armadas.

   Nas Policias Civis e Federal, a coisa fica bem diferente. Policiais e delegados não são decorrentes um do outro, as carreiras não tem uma sequência lógica e sequer fazem coisa similares. Já discutimos as funções do delegado de policia em outro artigo (veja aqui), e vimos que é uma figura sem identidade nos conceitos formais de juiz, Ministério Público e Polícia. Mas a tradição afasta a análise crítica e nos impede de ver que a polícia precisa de policiais, não de funções altamente burocráticas. É por isso que a unificação dos 
cargos não significa que todos chegarão a delegado, porque não há sentido em se manter essa função. A ideia é justamente que DELEGADOS SE TORNEM POLICIAIS.

  O que acontecerá é que TODOS os cargos de polícia que conhecemos hoje acabarão. TODOS. E em cada polícia surgirá um novo: POLICIAL. E o que fará este novo policial?

  Bem, o que qualquer policial pelo mundo faz: garante a segurança e investiga. Mas e quem fará a parte burocrática? Poucos policiais e funcionários administrativos. E quem fará a parte do delegado? Algumas partes os policiais, outras os administrativos, algumas o MP já faz, outras a Justiça já faz (na verdade os delegados é que fazem algumas funções dos dois últimos), os administradores, e outras... ninguém.

   E dos oficiais, quem fará a função deles? Os policiais que forem qualificados a ocupar as vagas disponíveis para tais funções.

   Portanto, ao contrário do que se fala, não haverá um "trem da alegria", visto que se pretende justamente é acabar com as tidas "carreiras superiores" por simples desnecessidade de sua existência. São funções caras, com pouca utilidade efetiva para a sociedade e que impedem os policiais de terem verdadeiramente uma carreira. 

  Sendo assim,o que teremos é: DELEGADOS PODERÃO TORNAR-SE POLICIAIS, e OFICIAIS PASSARÃO A SER FORMADOS NAS BASES. Fica até mais barato para o Estado, já que ele decide quantas vagas serão disponibilizadas para os salários maiores.