quarta-feira, 5 de março de 2014

Estão ressuscitando a PEC 37?

Está circulando pelas redes sociais e imprensa um documento atribuído a uma associação de delegados defendendo prerrogativas de magistrados para tal cargo: "independência funcional" (entenda-se: fazer o que bem quiser) e não mais se submeter ao controle externo (olha o porque são contra a PEC 51, que defende uma Ouvidoria além do MP). Mas... para que?

Bom, sinceramente não vejo utilidade alguma. Aliás, vejo com séria preocupação: como uma função estatal pode ter o uso da força, a restrição de direitos e não ter controle nem punição? Ou um ou outro, pois tudo junto é poder demais.

Nas democracias consolidadas as polícias recebem severo controle: quem tem a força tem que ser monitorado. Tanto é assim que os modelos atuais de polícia sempre envolvem severa proximidade do MP, principalmente nas investigações. No mundo ocidental, nos países democráticos ao menos, NÃO HÁ uma policia repleta de poderes. Muitas, aliás, tem duplo controle do Executivo - sendo vinculadas aos nossos equivalentes Ministério da Justiça e Ministério da Defesa - e seus atos de restrição de direitos e de investigação submetidos ao MP e à Justiça. E mesmo assim não são poucos os desvios. Obvio que nem se comparam aos ocorridos no Brasil.

A polícia tem duas finalidades: GARANTIR os direitos individuais e coletivos, basicamente mantendo a ordem social e OBTER INFORMAÇÕES caso crimes tenham ocorrido. E essas informações serão utilizadas pelo Estado - normalmente através do Ministério Público - para que a Justiça decida se deve apenar alguém ou não, pois sua função é impedir a vingança.

Como membros de um poder, Juízes e Promotores sofrem pressões, e por isso é garantido a eles somente serem removidos se concordarem com isso. Novamente, esse é o padrão das justiças em outros países. A pressão é inimaginável, já que a decisão do juiz é quem de fato decidirá o futuro de um indivíduo ou grupo.

Já a policia, apesar de suas características diferenciadas, não sofre tamanha pressão POLÍTICA, salvo de forma interna: é a investigação que deve seguir uma linha porque o delegado quer, é o delegado que é pressionado pelo chefe de polícia (delegado) para fazer determinado relatório... pressões não tão diferentes das que sofrem um professor que adota certa linha de ensino.

Mas e as "remoções de geladeira"? Novamente, o caráter é meramente político e interno. Toda remoção deve ser justificada. Se o servidor não concorda, pode questionar administrativamente, e se recusado, judicialmente. Em suma: não é o Governador ou Presidente que remove o servidor, é o administrador - normalmente um delegado - quem determina.

Além do mais, o juiz de direito é o 3o escalão do Poder judiciário (Ministros dos tribunais, desembargadores, juízes), já os delegados são, no mínimo, 4o (Governador, Secretario, chefe de policia, delegado), tal qual os policiais ou qualquer servidor público. No contexto da Justiça, a polícia é mero acessório, tanto que não é o único órgão que investiga. Ele não representa um poder, ele é um servidor público do Executivo. O juiz também é servidor público, mas ele é a base do Poder Judiciário, seu motivo de ser. Não há similitude alguma. Em nada. E ainda é subordinado à Justiça quando esta precisa utilizar a força - sofrendo uma espécie de filtro do Executivo. Mas parece que alguns querem mais poder que a Justiça.

Portanto para que as mesmas prerrogativas? Para piorar o que já não funciona? Se são so delegados que ocupam funções comissionadas de administração e presidem o inquérito policial - o instrumento de formalização da investigação policial no Brasil - de quem é a culpa pels 95% de homicídios não elucidados, dos 97% de roubos sem solução, ou dos 92% de latrocínios de "autoria desconhecida"? E se com certo controle já está assim, imagine sem controle nenhum?

Ah, sim: esse era o teor da PEC 37.