sábado, 19 de outubro de 2013

A PEC 51 e unificação das carreiras tanto na Polícia Civil como na Federal

                Um questionamento comum é o seguinte: mas se virar carreira única os policiais virarão delegados sem concurso?

                Parece um problemão, certo? A Constituição proíbe o “trem da alegria”, então seria impensável algo assim. Mas aí que a ficha cai: mas quem trabalha na polícia: O POLICIAL. O mundo todo sabe disso.

                Então a carreira única está praticamente pronta em todas as polícia civis e federal, pois inspetores, comissários, agentes, escrivães, oficiais de cartório, são funções que já se misturam, que a todo tempo fazem a “tarefa do outro” e no geral possuem os mesmos critérios de aprovação no concurso público. Portanto a chamada unificação das carreiras (não das polícias, que não é objeto desta PEC) é mera formalização do que já existe, e cumpre as exigências legais: rendimentos IDÊNTICOS e atribuições similares.M as as polícias hoje possuem 2 funções que não se encaixam neste perfil: as de perícia e a dos delegados. Então, como integrá-las à carreira policial?

                Não pode. Nem deve. Quem assiste CSI sabe que os peritos não são policiais, que os promotores  não são policiais, que somente os policiais são policiais. Se os países europeus exportassem séries policiais, descobriríamos que lá não é diferente.

                As carreiras POLICIAIS, que tratam de INVESTIGAÇÃO, são únicas, ou seja: o policial que CHEFIA a polícia é o que um dia foi novato. O que é responsável pela investigação realizada pela EQUIPE é um policial que também um dia foi novato. E não necessariamente é formado em ciências jurídicas. Em alguns países um percentual deve ser respeitado (Portugal exige que 35%, no mínimo, dos novatos sejam formados em Licenciatura em Direito), em outros a formação se dá dentro da própria policia (BKA, a polícia federal alemã, a MET inglesa, conhecida como Scotland Yard) ou já recebe com nível superior variados, sendo quesito a participação em cursos específicos e desempenho para  promoção (FBI americano).

                As funções administrativas  tanto aqui quanto nos países com policias de origem civil, são apartadas das funções policiais. Fazem parte da polícia – e são imprescindíveis a ela - mas não da carreira policial.

                Já as perícias nem sempre fazem parte do corpo policial, sendo tidas como complementares ou auxiliares – termo injusto, dada a importância da perícia na investigação policial - visto que não é uma carreira policial mas sim civil. O conhecimento altamente específico do perito em sua área tem um motivo de ser e não é para investigar criminalmente, mas sim cientificamente. Cabe ao juiz decidir o que fazer com os dados científicos levantados e processados pelo perito quando confrontados com o relatório de investigação e os depoimentos em juízo.

                E o delegado? Bom, aí começa o problema, que é mais cultural do que legal ou funcional.

                O delegado, por questões culturais, é tido como o “chefe” geral das polícias. A visão que se tem é de que ele estaria pra os policias como os oficiais estão para os praças no Exército ou na PM. Não é verdade.
                Esta função tem por objetivo conduzir a investigação e fazer  SUCINTO RELATÓRIO ao final da mesma. É como um resumo do procedimento, que hoje se chama inquérito policial. Mas o que acontece na realidade é que foi se criando uma cultura de burocracia na investigação, que não ajuda o inocente e contribui para a impunidade, visto que o primeiro responderá pelo que não fez e o culpado não responderá pelo que fez. É uma papelada que vai e volta e não se chega a conclusão nenhuma de nada. Então começou a ser importante haver o delegado para embolar o novelo e depois desembolar. Mas para que embolar?

                Antigamente a polícia era chefiada por um juiz ou um bacharel em direito. Antigamente falamos ai... uns 1836! Império ainda! Então o Imperador  decretou que juízes não poderiam cuidar da investigação e julgar. O responsável pela polícia (o sujeito delegado pelo chefe de polícia a cuidar das investigações, por isso tal nome) não precisava mais ser bacharel em direito. Mas continuou com muitos poderes – como determinar entrada em casa alheia para busca e apreensão – que foi muito útil ao Regime Militar e acabou com a redemocratização quando da promulgação da nossa Constituição em 1988.

                O código de processo penal explica bem explicadinho o que deve fazer para se emitir o tal relatório do inquérito. Não é nada complexo. Não se necessita de 5 anos de faculdade para tal, e prova disso é que os cursos de Bacharelado em Direito não possuem cadeiras que tratem de condução de inquéritos ou mesmo de investigações, mas sim de processo penal e crimes com suas jurisprudências – decisões judiciais que só podem ser aplicadas pela polícia quando há uma ordem superior uniformizando procedimentos.

                Por isso para ser delegado precisa-se do curso de Direito: porque em 1836 o cargo era ocupado por magistrados nomeados para tal pelo Chefe de Polícia, não porque “é necessário para as garantias do investigado”. Disso cuidam o Ministério Publico e, principalmente, o juiz. Não é função da polícia isso.

                O procedimento Inquérito Polícia é instrumento ineficiente. Nenhuma reforma será plena se não se fizer alterações neste sentido. Até mesmo se levarmos em conta o que diz o Código de Processo Penal, que não exige papeladas e malabarismos da polícia na investigação, á ajudará muito.

                Portanto, a unificação de carreiras é dar a Cesar o que é de Cesar: policia investiga e faz um relatório, que vai para as mãos do MP.  Um policial, em tese mais antigo, experiente e com perfil, assume a chefia de determinado grupo para coordenar atividades (e não ser dono da investigação). Estas são as funções de um policial.    

                Já os peritos ficam em separado da carreira policial, pois tem atividade própria: a de perícia. Esta não se confunde com função policial. Se ficam dentro da polícia ou fora e mera questão política.

E os delegados? Bem, como vimos, estes não são “o topo da carreira policial”, pois  sua função é  mera parte da atividade, o sistema adotado por todo o mundo. Hoje representam o status, não a atividade investigativa de fato. São o topo em termos salariais e por ocuparem cargos de confiança nos governos, o que naturalmente os encaminha para as chefias. Há questões culturais também, pois por anos foi exigido nível superior para ingresso enquanto os policiais não havia isso. Desta forma, naturalmente eram os chefes por terem maior nível de formação, não por serem bacharéis em Direito.

Sendo assim não precisam fazer parte da carreira policial. Podem até mesmo pleitear carreira jurídica em outras instituições ou mesmo na própria polícia, como consultores jurídicos e atividades correlatas, mas não por investigação, não sendo necessária sua participação na atividade policial, seja investigativa ou de patrulhamento.